O livro digital "Pesquisa Nacional sobre o uso de crack – Quem são os usuários de crack e/ou similares do Brasil? Quantos são nas capitais brasileiras?”, organizado pelos pesquisadores do Laboratório de Informação em Saúde (Lis/Icict), Francisco Inácio Bastos e Neilane Bertoni, está disponível online. A pesquisa foi originalmente lançada em setembro de 2013. O livro está disponível para a consulta, com um detalhamento maior das informações.
A pesquisa, considerada a maior do mundo, visou a investigação, além da exploração etnográfica das cenas de uso e inquérito epidemiológico, de abrangência nacional, com o propósito de traçar o perfil dos usuários de crack em todo o país, indo às cenas de consumo da droga. A pesquisa foi coordenada pelos pesquisadores Francisco Inácio Bastos e Neilane Bertoni.
Ela servirá para orientar as políticas governamentais e sociais para lidar com a população usuária de crack e outras drogas similares.
Um dos pontos altos da pesquisa é mostrar que o crack não pode ser visto como a única droga existente no Brasil, com potencial que cause danos à população, pois outras drogas ilícitas, como a cocaína, por exemplo, também estão presentes no dia a dia do brasileiro.
Mesmo assim, além de trazer números sobre a real situação do crack no país,a “Pesquisa Nacional sobre o uso de crack” revela que são as vulnerabilidades sociais que marcam o usuário – jovens adultos, homens e mulheres – a maioria com baixa escolaridade e negros ou pardos, evidenciando que o uso do crack é, no Brasil, atualmente, um problema social.
Perfil do usuário no Brasil
A pesquisa, desenvolvida pelo Icict, sobre o uso de crack (“Estimativa do número de usuários de crack e/ou similares nas Capitais do País” e “Perfil dos usuários de crack e/ou similares no Brasil”), ressalta, entre outros aspectos, o fato de que na região Sul, 52% dos usuários de drogas usam crack, enquanto que na região Norte este percentual é de 20%.
Ela aponta que o Nordeste é a região cujas capitais têm uma maior prevalência/proporção de usuários, estatisticamente igual à região Sul, levando os pesquisadores a afirmarem que “não é possível tratar o crack como um problema nacional homogêneo, se temos diferenças regionais acentuadas”.
Para os pesquisadores da Fiocruz “quase 80% dos usuários no país têm vontade de receber tratamento, o que torna esvaziada a questão da internação compulsória”. Este dado em si já é norteador para o planejamento de ações referidas às redes de cuidado necessárias ao enfrentamento de questões aqui mencionadas.
Na pesquisa o perfil dos usuários revela que “são pessoas em situação de grande vulnerabilidade. Quase metade dos usuários das capitais estava em situação de rua, e não se pode afirmar se começaram a usar e foram para a rua ou se já moravam nas ruas e começaram a usar. Em sua imensa maioria, eles não têm trabalho regular”.
A pesquisa ressalta com dados “que em algumas ações do Plano “Crack, é possível vencer” a política está acertando”, concluindo que é preciso intensificar o que está no caminho certo. Mas, em outras ações, será necessário realinhar a política que tinha sido pensada antes. Este é o caminho desejável em políticas públicas, realinhar políticas toda vez que surgirem novas evidências empíricas”.
Homens e mulheres
Dentre os resultados apontados, é possível verificar que entre as mulheres, 8,17% eram portadoras do HIV, índice que, nos homens, chegava a 4,01%. Com hepatite C, as mulheres representaram 2,23% dos infectados e os homens, 2,75%. Outros números que chamam a atenção é que na faixa entre 18 e 24 anos, as mulheres representam 37,41% dos consumidores, contra 29,67% dos homens. Ou que de todas as entrevistadas, 55,36% afirmaram ter praticado sexo ou feito trabalho sexual em troca de dinheiro para comprar a droga ou do próprio crack, e que 40,04% das entrevistadas sofreram violência sexual nos últimos 12 meses, número tão alto quanto o de homens, que responderam positivamente a esse item na pesquisa: 37,79%.
Duas inovações nas metodologias foram incorporadas na pesquisa: a Time Location Sampling (TLS), que permitiu acessar a população flutuante dos usuários de crack e /ou similares (pasta-base de coca, merla e oxi, que assim como o crack são consumidos em cachimbos, latas e copos, ou em outros aparatos similares) nas cenas de uso da droga, e a Network Scale-up Method (NSUM), através do inquérito domiciliar, que possibilitou realizar as estimativas do número de usuários no país. Ao todo, foram entrevistadas 32.359 pessoas (24.977 no inquérito domiciliar e 7.381 usuários nas cenas de uso).
Com as metodologias utilizadas foi possível uma avaliação mais precisa sobre quem é e quantos são os usuários para que, a partir daí,as autoridades e especialistas – governantes e pessoal que atua diretamente com problema – possam determinar quais as melhores políticas públicas voltadas a esse público.