Pesquisa mapeia práticas de cuidado em saúde mental, álcool e outras drogas na atenção básica em Manguinhos

 

O Programa Institucional, em parceria com o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (LAPS), da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, está desenvolvendo pesquisa sobre as práticas de cuidado em saúde mental, álcool e outras drogas dos dispositivos da atenção básica da região de Manguinhos.

O trabalho tem como objetivo geral construir uma cartografia dos dispositivos da atenção básica no que diz respeito aos recursos formais e informais utilizados para práticas de cuidado em saúde mental, álcool, crack e outras drogas na região de Manguinhos, área programática 3.1 do Rio de Janeiro. “Fazer uma cartografia é diferente de fazer um levantamento. É um mapa mais completo, que trabalha com as dinâmicas locais. Questões de saúde mental numa comunidade como Manguinhos são complexas, têm todo um contexto social que deve ser entendido”, diz a pesquisadora da ENSP Ana Paula Guljor. O trabalho é coordenado por Paulo Duarte de Carvalho Amarante (foto acima).

A pesquisa tem como objetivo, segundo a pesquisadora Ana Paula Guljor, conhecer melhor as questões relacionadas ao cuidado na região - não somente como “dados frios”. A ideia é se aproximar de profissionais, agentes locais e membros da comunidade, para apurar os principais impasses, demandas e buscar reconhecer a rede de apoio informal.

Há moradores e grupos religiosos, por exemplo, que dão esse apoio. Às vezes, no caso de uma emergência, não há uma ambulância, mas a comunidade consegue um carro ou um táxi para conduzir o paciente a uma unidade de saúde. Ou seja, se existem falhas nas redes formais de apoio, esta rede informal tem um papel de extrema importância. “Pessoas que compõem estas redes preenchem a lacuna do Poder Público”, diz Ana Paula.

Um dos aspectos interessantes da pesquisa é que haverá encontros com a comunidade, em oficinas de validação, para ir apresentando e debatendo os dados que estiverem sendo encontrados no estudo. “Quando se trabalha em parceria com a comunidade, quando os resultados retornam para ela, com o respaldo do conhecimento científico, é possível levantar melhor as demandas e encaminhá-las ao Poder Público”, explica a pesquisadora.

Os trabalhos de campo já começaram. Em 2017, após a finalização da pesquisa, será realizado um seminário, serão produzidos artigos científicos e um livro será publicado com os resultados da pesquisa.

O título da pesquisa é “Práticas de cuidado em saúde mental, crack, álcool e outras drogas na atenção básica em áreas de vulnerabilidade social: Desafios e impasses na gestão do cuidado”.

A inclusão das ações de saúde mental, álcool e outras drogas na Atenção Básica é um desafio para as equipes de saúde mental bem como para a atenção básica. Inicialmente eram os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) os responsáveis pelo apoio técnico – apoiadores - às equipes clínicas.

Posteriormente foram instituídos os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), com o objetivo de proporcionar matriciamento apropriado para os impasses observados. Estas iniciativas apontam para estratégias de incorporação de uma lógica de cuidado que coadune com as diretrizes da Reforma Psiquiátrica.

Desde 2006, a publicação conjunta da Coordenação Nacional de Saúde Mental e Coordenação da Gestão de Atenção Básica do Ministério da Saúde, ressalta a organização do apoio técnico, a formação profissional e a inclusão de indicadores da saúde mental na Atenção Básica como aspectos significativos e estruturantes.

Entretanto, decorrida uma década, o manejo de ações de saúde mental por profissionais da estratégia de Saúde da Família é ainda frágil no que diz respeito ao cuidado integral. Desta forma, propõe-se o levantamento das necessidades de profissionais da atenção primária no tocante às ações em saúde mental, álcool, crack e outras drogas seus desafios e impasses.

O mapeamento em questão, efetuado por meio de uma cartografia de serviços, equipamentos e outros recursos não sanitários, abrangerá uma região de grande vulnerabilidade social no município do Rio de Janeiro: a Comunidade de Manguinhos, tendo como campo a Estratégia de Saúde da Família e os pontos de Atenção da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) local.

Da mesma forma, buscará a identificação dos principais impasses na oferta e no acesso ao cuidado em saúde mental, álcool, crack e outras drogas nos serviços de saúde da RAPS na perspectiva das equipes e das lideranças comunitárias participantes da pesquisa. É frequente que as questões relativas ao acolhimento, inserção psicossocial e o acesso aos serviços não sejam valorizadas em detrimento dos resultados clínicos e epidemiológicos. Entretanto, são repetidamente identificadas como impasses no cuidado à população em sofrimento psíquico.

Importante destacar a existência nesta comunidade de indicadores precários de IDH, o alto índice de violência com frequentes intervenções policiais e de cenas de uso coletivo de substâncias psicoativas, principalmente o crack. Assim, os recursos intersetoriais são determinantes para a integralidade do cuidado, principalmente se considerado o campo que envolve o uso abusivo de álcool, crack e outras drogas. Objetiva-se, portanto, obter um levantamento ampliado dos problemas de saúde mental, álcool, crack e outras drogas que mais preocupam os profissionais, bem como os impasses e desafios na oferta de recursos e no acesso ao cuidado a esta clientela.

 

Consultório na Rua de Manguinhos – Clínica da Família Victor Valla

O Consultório na rua de Manguinhos, com base na Clínica de Família Vitor Valla, é um dos pontos de convergência para esta pesquisa. Ele tem o objetivo de facilitar o acesso da população em situação de rua aos serviços de saúde.

Atende usuários em situação de rua, em sua maioria envolvidos com uso abusivo de crack, álcool e outras drogas, realizando o acolhimento, ações de promoção e prevenção da saúde e cuidados primários de saúde, articulado aos demais dispositivos da RAPs no território. O trabalho é realizado de acordo com a Política de Saúde Mental e da abordagem da Redução de Danos.

O Programa Institucional Álcool Crack e outras Drogas tem realizado diversas ações de apoio no local, por exemplo, fornecendo lanches para consumo dos usuários da equipe (biscoitos e achocolatados); dois armários para uso dos profissionais da equipe; material de papelaria (grampeadores, tesouras, giz de cera, fita adesiva, papel crepom). As compras foram realizada em abril e maio de 2016 e o recurso utilizado foi do TED 031/2014, projeto “Apoio Institucional aos Estados no Processo de Implementação da Rede de Atenção Integral a Saúde (RAS)”.

Ações comunitárias, que visam trazer visibilidade e atrair a comunidade para abraçar este projetos, também têm um papel estratégico. Em 12 de julho de 2016, foi realizado o Arraiá da Rua e o lançamento do apoio do Programa Institucional Álcool, Crack e outras Drogas ao Consultório na Rua. Fornecido insumos para alimentação e decoração da festa e pagamento do DJ. Em 15 de agosto de 2016, aconteceu uma oficina culinária com os usuários do Consultório na Rua.

O Consultório na Rua realiza o acolhimento e as ações de prevenção, cuidados primários, promoção da saúde e redução de danos, articulando o conjunto de equipamentos e de equipes intersetoriais do território e fora dele.

Em Manguinhos, a população que se encontra em situação de rua está, na sua maioria, envolvida com o uso abusivo de crack, álcool e outras drogas e a atenção à sua saúde constituiu pauta de reivindicação dos moradores de Manguinhos na Conferência Local de Saúde, realizada em 2011. Neste mesmo ano, o Consultório na Rua do Teias-Escola Manguinhos foi originado, com base na Clínica da Família Victor Valla, tendo o objetivo de garantir à essa população, quer seja moradora ou não de Manguinhos, o acesso à atenção à saúde, de forma rápida e eficiente.

O trabalho com usuários de álcool e outras drogas é realizado de acordo com a Política de Saúde Mental e da abordagem da Redução de Danos.

Esta é uma estratégia que acolhe e presta cuidados de saúde ao usuário, mesmo quando ele não consegue manter abstinência das drogas - buscando a redução dos riscos tanto orgânicos quanto sociais.

O acolhimento e as ações de prevenção, cuidados primários e promoção da saúde realizados pelo Consultório na Rua são apenas a primeira atenção à saúde dessas pessoas, que na maioria das vezes necessitam de outros cuidados: de um Centro de Atenção Psicossocial focado em álcool e outras drogas (CAPS AD), da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) ou até mesmo da atenção de outro setor social como a Assistência Social.

Articular o trabalho com essas pessoas no espaço mesmo em que elas se encontram (a rua) e no espaço que elas são incentivadas a procurar (a Clínica da Família) e articular o conjunto de equipamentos e de equipes intersetoriais do território e fora dele é o grande desafio do trabalho do Consultório na Rua.

O Apoio aos serviços da Rede RAPS no território de Manguinhos e arredores, enfim, inclui promoção de oficinas, debates, atividades culturais nos territórios e distribuição de insumos de prevenção, promoção da saúde e redução de danos, promovendo o vínculo dos usuários com os dispositivos de saúde.

Os insumos incluem alimentos e bebidas, tais como achocolatados e biscoitos, assim como preservativos, protetores labiais e parafernália para uso de drogas que previnem o risco de transmissão de DST’s, hepatite C e tuberculose.