Nos dias 12 e 13 de setembro o Programa Institucional de Política de Drogas, Direitos Humanos e Saúde Mental da Fiocruz (PDHSM-Fiocruz) e o Laboratório de Estudo e Pesquisas em Saúde Mental e Atenção Psicossocial (LAPS-Fiocruz) realizaram o Simpósio Latino Americano – Redução de Danos: a que será que se destina?. O evento fez parte da programação do 7º Fórum de Direitos Humanos e Saúde Mental da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) e teve como sede a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Contando com grande presença de público, o Simpósio teve quatro mesas de debate que abordaram histórias da redução de danos, questões sobre a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), política de drogas e os desafios da redução de danos para infância e adolescência.

Mesas destacam a importância da escuta como insumo de trabalho dos Redutores de Danos
A primeira mesa, intitulada “Histórias da Redução de Danos: Diálogos sobre a prática”, reuniu experiências diversas de atuação no campo. Thiago Calil (Redutor de Danos – SP) resgatou memórias de 2004 na cena de uso aberto na região da Luz em São Paulo, conhecida e estigmatizada por muitos como Cracolândia, quando a distribuição de cachimbos abriu portas para o diálogo com usuários. Arlete Inácio (Cientista Social – RJ) relatou sua trajetória como redutora de danos, com uma grande mudança profissional para se dedicar à saúde mental, destacando a escuta nas ruas como base do cuidado. Já Priscila Gadelha (Escola Livre de Redução de Danos – PE) trouxe reflexões sobre justiça reprodutiva, gênero e as motivações do uso de drogas, ressaltando a importância de criar espaços de fala. A mediação foi conduzida por pelo pesquisador Denis Petuco (EPSJV-Fiocruz), que também compartilhou vivências na redução de danos.

Na sequência, a mesa “RAPS e Redução de Danos: contos reais de práticas de criatividade e cuidado” apresentou experiências ligadas ao trabalho na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Luiza Ribeiro (Terapeuta Ocupacional CAPSI – SP)destacou a importância da aliança comunitária e criticou os impactos da terceirização nos serviços de saúde. Fernando Meira (Médico de Família – BA), médico de família, relatou desafios enfrentados com moradores de rua e adolescentes, defendendo o vínculo como essência do cuidado. Daniel de Souza relatou as ações do Consultório na Rua, entidade que atua, que incluem oficinas e eventos culturais para fortalecer laços comunitários. O mediador Daniel Elia (PDHSM – Fiocruz)ressaltou que a relação com o território é um dos pontos centrais no trabalho e no cuidado.

A terceira mesa, “Política de Drogas, Estado e Sociedade Civil: conjuntura latino-americana, diálogos e interlocuções”, trouxe um panorama crítico sobre a guerra às drogas. Pablo Cymerman (Associación Civil Intercambios – ARG) recuperou a história da redução de danos na América Latina e defendeu políticas intersetoriais para este debate amplo que envolve diversas questões sociais. Já Nathália Oliveira (Iniciativa Negra – SP) relacionou drogas e justiça climática, analisando a atuação do crime organizado na Amazônia e os impactos da política de armas no Brasil. Já Priscila Gadelha (Escola Livre de Redução de Danos e Renfa) falou sobre as redes de mulheres usuárias de drogas na América Latina e a luta por espaços de acolhimento e direitos. Na mediação, Francisco Netto (PDHSM – Fiocruz) enfatizou a necessidade de encontros regionais e a urgência de debates sobre diferentes substâncias como um contraponto à falida política de guerra às drogas.

Encerrando o simpósio, a mesa “Infância e juventude: desafios para o cuidado em Redução de Danos” deslocou o olhar da substância para as dimensões sociais da vida. Giovana Borges (Janela da Escuta – UFMG) destacou o combate ao racismo como eixo fundamental. Em seguida, Diego Alves (PPCAAM) abordou a fragilidade das políticas públicas e suas consequências para a garantia de direitos. Daniele Menezes (Degase) tratou do cuidado e sua construção de base territorial, como eixo da redução de danos com jovens e adolescentes. A mediação de Ana Paula Guljor (Abrasme/PDHSM-LAPS-Fiocruz) reafirmou a visão da redução de danos como cuidado integral, atento às dimensões sociais, culturais e territoriais.

Debates reafirmam redução de danos como campo vivo e que abrange diversas esferas da vida
Com essa diversidade de debates, o simpósio se consolidou como um espaço de troca e fortalecimento da perspectiva da redução de danos na América Latina. As mesas demonstraram que o tema vai além da questão do consumo de substâncias, articulando-se com direitos humanos, saúde, justiça social, gênero, infância e juventude.
Ao longo desses dois dias diálogos, foi possível reafirmar que a redução de danos é um campo vivo, tecido a partir das experiências de quem está nos territórios. A história de cada redutor de dano e de cada usuário revela que cuidar é, antes de tudo, estar presente, construir laços de confiança e oferecer alternativas possíveis diante das desigualdades e violências que marcam nosso cotidiano.