Harm Reduction International Conference volta a ser realizada na América Latina depois de 27 anos
A 25ª edição da Harm Reduction International Conference (HRIC) ocorreu em Bogotá, Colômbia, entre os dias 27 e 30 de abril de 2025, marcando o retorno do evento à América Latina após 27 anos da Conferência ter sido realizada em São Paulo.Organizada pela Harm Reduction International em parceria com a Corporación Acción Técnica Social (ATS), a conferência reuniu mais de mil participantes de diversos países, incluindo profissionais de saúde, pesquisadores, formuladores de políticas públicas, representantes da ONU, usuários e ativistas. A delegação brasileira no evento contou com a presença da Plataforma Brasileira de Política de Drogas, da Iniciativa Negra, além da Fiocruz, representada pelo Programa Institucional sobre Política de Drogas, Direitos Humanos e Saúde Mental (PDHSM/Laps/Fiocruz).
A Conferência ocorreu um mês após a 67ª Sessão da Comissão de Narcóticos das Nações Unidas (CND), realizada em Viena, na Áustria. Ana Paula Guljor, coordenadora do Programa de Política de Drogas, Direitos Humanos e Saúde Mental da Fiocruz, apontou a importância do evento reverberar os avanços debatidos em Viena: “Foi reafirmada uma perspectiva global da importância fundamental na política de drogas global de uma estratégia de redução de danos ampliada, entendendo a qualidade de vida, o bem-estar das pessoas e a proteção social para os vulnerabilizados, principalmente, como sendo parte integrante dessa estratégia.” apontou a pesquisadora.
Mesa aborda política de drogas e redução de danos no Brasil

O retorno do evento à América Latina acontece em um momento importante para a região com avanços no debate sobre o porte de maconha no Brasil e, especialmente, na discussão trazida pelo presidente colombiano, Gustavo Petro, sobre a necessidade de reformas na política de drogas, com enfoque na regulamentação da cocaína. Esses debates colocam a política da redução de danos como necessária para a reforma da política de drogas, em contraponto a atual política de guerra às drogas. Os participantes da delegação brasileira no evento destacaram ainda que a realização do evento na Colômbia expõe a necessidade de protagonismo do Sul Global nas proposições sobre política de drogas.
Dentro desse contexto, no dia 28 de abril, foi realizado dentro da programação do evento o debate Perspectivas Brasileiras sobre Reforma da Política de Drogas e Redução de Danos. Nesta mesa, Priscila Gadelha (Escola Livre de Redução de Danos), Vanda Canuto (Espaço Normal), Ana Luiza (É de Lei), Dudu Ribeiro (Iniciativa Negra) apresentaram os custos financeiros, sociais e humanos associados às políticas de proibição de drogas no Brasil. Enquanto, Ana Paula Guljor (Programa de Política de Drogas/Fiocruz) e Thiago Calil (FCT/UNESP) exploraram as perspectivas sobre cenários de uso de crack e basuco em São Paulo e Bogotá, analisando contextos sociais, desafios e o potencial para intervenções de redução de danos.
Sobre o debate, Dudu Ribeiro destacou: “Essa mesa demonstrou a força e o reconhecimento do trabalho de redução de danos brasileiro no cenário internacional com o reconhecimento de muitas entidades de outros países. Além disso, foi apresentada uma diversidade de trabalhos na redução de danos do Brasil, expondo que essa diversidade não impede a articulação política enquanto campo, trocando experiência e compartilhando tecnologias para fortalecer o cuidado e a liberdade na América Latina.”.
Revista integra política de drogas e debate ambiental
Outro evento realizado pela delegação brasileira foi o lançamento da edição especial da revista PLATÔ INTERSECÇÃO. Fruto de parceria entre a Iniciativa Negra, a Plataforma Brasileira de Política de Drogas e a International Coalition on Drug Policy Reform and Environmental Justice, a revista, que conta com 17 artigos inéditos, é reflexo de um movimento coletivo que aponta soluções integradas como estratégia para enfrentar duas crises conectadas que comprometem a governança territorial no país: a emergência climática e a violência decorrente da guerra às drogas. Rebeca Leher ressalta como a publicação traz uma nova dimensão para o debate sobre drogas: “Na publicação, a gente tenta tirar o debate sobre as drogas apenas da área de saúde e da justiça criminal e colocá-lo como uma pauta de governança territorial e de justiça e reparação.”.
Evento reafirma a necessidade de um debate humanizado sobre drogas

Com abordagens sobre os mais diversos pontos da política de drogas e, especialmente, da redução de danos, o evento mostrou mais uma vez sua importância ao destacar a necessidade de transformar a forma como falamos de drogas. Humanizar a forma como o tema é encarado fugindo ao tom policialesco, desumanizador e moralista que permeia o debate público e que perpetuam ciclos que causam danos a milhares de pessoas é essencial e a América Latina tem sido pioneira. Francisco Netto, coordenador do PDHSM da Fiocruz falou sobre a a importância de o evento voltar ao continente: “A volta à América Latina é fundamental na atual conjuntura internacional, especialmente na Colômbia , que está no centro da economia global da cocaína, com seu povo sofrendo o impacto das políticas punitivas de drogas. A posição do atual presidente colombiano, Gustavo Petro, de regulamentação da cocaína, traz protagonismo para o país numa abordagem mais humana, eficaz e justa sobre como lidar com a política de drogas, trazendo mais clareza acerca do acerto da escolha do local para realizar este evento”.